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sexta-feira, setembro 2

Os Essênios na obra de Flávio Josefo


SAPIENS - Revista de História, Património e Arqueologia, n.º 2, 2009
| Marcel Paiva Monte - Os_Essénios_na_obra_de_Flávio_Josefo...

1. Introdução
Algumas das mais importantes referências aos Essénios surgidas na literatura clássica ocorrem nas obras de Flávio Josefo. As suas descrições desta seita, contidas na Guerra Judaica e nas Antiguidades Judaicas2, serão utilizadas como base deste trabalho3.
Nos nossos dias, o confronto destas informações de Josefo com os próprios textos possuídos, produzidos ou comentados pelos Essénios, devido ao presente consenso acerca da sua identificação com a comunidade de Qumran4, tornou possível, não apenas um estudo aprofundado dos Essénios e da sua organização interna, da sua vida quotidiana e da sua doutrina, mas também colocar sob perspectivas mais diversificadas a própria obra do historiógrafo judeu. As tentativas para aferir o grau de conhecimento do autor sobre o Essenismo; as escolhas e omissões deliberadas ou inconscientes que fez nas suas descrições, assim como o nível de convencionalismo literário por ele empregue no conjunto da sua obra, são questões que elevaram bastante o potencial de análise sobre a visão de Josefo acerca do Judaísmo, das diversas correntes sectárias dele surgidas e das suas relações com o mundo greco-romano.
O modesto objectivo deste trabalho passa por tentar compreender as intenções subjacentes à descrição que Josefo fez do modo de vida essénio, tendo em conta os objectivos mais gerais da sua obra. Passa, sobretudo, por perceber se Josefo teve a intenção de inserir, na sua obra historiográfica, elementos de um género literário identificado com as utopias. Para cumprir esse objectivo, parece-nos essencial
2 Dada a escassez de traduções portuguesas, escolhemos verter, nós próprios, para a nossa língua, as passagens citadas dos textos antigos. Para o efeito recorremos às edições, em línguas modernas, referenciadas na bibliografia final.
3 Não abordaremos, por exemplo, as referências sobre os Essénios que Fílon, Judeu de Alexandria, deixou nos fragmentos da sua obra (especialmente Quod omnis probus liber sit, §§ 75-91; Pro judaeis defensio, esta última um fragmento contido na obra de Eusébio de Cesareia, Preparatio Evangelica VIII.12. Interessa-nos circunscrever o trabalho à figura de Josefo com o intuito de compreender a dimensão utópica das suas próprias informações sobre os Essénios. Seria interessante o confronto de Josefo com as informações de Plínio-o-Velho (Historia Naturalis, livro 5, 73), apesar de ultrapassar o âmbito deste trabalho. Esta descrição do local onde viviam os Esseni de Plínio é credível e semelhante às dos outros autores clássicos.
4 Com efeito, a identificação dos Essénios com a comunidade que habitava Qumran, nas margens do Mar Morto, não foi automática, tendo sido alvo, nos inícios da sua pesquisa, por intensos debates. Acerca da definitiva associação entre este grupo ao local, cf. Beall, 1988. Talvez o indício mais pungente, entre as informações provenientes da própria Antiguidade, seja o relato de Plínio-o-Velho, que os coloca muito próximo de Qumran, ao localizá-los perto de ‘Ein Gedi (Engada): «...infra hos [dos Essénios] Engada oppidum fuit...», Historia Naturalis 5, 73.
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estabelecer como pressuposto a distinção entre duas dimensões desta problemática: por um lado, o Essenismo enquanto experiência concreta, vivida por muitas pessoas, e enquanto realidade identificável no espaço e no tempo; por outro lado, o discurso de Josefo acerca dos Essénios, que era certamente condicionado pelos objectivos gerais que conduziam o seu labor literário, reflectidos na sua obra globalmente considerada. Só assim, parece-nos, poderemos perceber se existe algum laivo de utopia ou pensamento utópico presente na sua visão sobre os Essénios, ou se a natureza das suas descrições deve ser percepcionada de maneira diferente.
2. Josefo entre dois mundos
Observando a vida de Josefo5, podemos perceber facilmente o seu comprometimento, não apenas com a cultura greco-romana que enquadrava o Mediterrâneo Oriental no séc. I da era cristã, mas também com o próprio establishment político, tanto em Roma como na Judeia. A sua acção limitada, apesar de consequente, durante a grande revolta dos Judeus, iniciada em 66 d.C., mostra-nos isso mesmo, como veremos adiante. Com efeito, a acção e o trabalho historiográfico de Josefo desenrola-se em duas frentes. Se, por um lado, procura comunicar com o mundo greco-romano e helenístico oriental em que se integrou, e que dominava a civilização do Mediterrâneo Oriental no seu tempo, por outro lado, contudo, não deixava de procurar também preservar a sua ligação com o mundo judaico que o viu nascer. Como diz G. Mader: «...the historian “between Jerusalem and Rome” engages his Greco-Roman readers in their own terms, gives plausibility to an interpretation designed to deflect animus and criticism from the Jews as nation, while at the same time explaining the Romans to the Jews» (Mader, 2000: 147).
Dois anos antes do eclodir da insurreição judaica do ano 66, Josefo fizera parte de uma embaixada enviada a Roma com o intuito de libertar alguns sacerdotes judeus cativos na urbs. Auxiliado por um actor aí residente, chamado Alituro e, ao que conta, pela própria esposa de Nero, Popeia Sabina, consegue levar a cabo a sua missão com bastante sucesso, tendo mesmo recebido presentes de Popeia como sinal de
5 Para uma visão geral da vida e obra de Flávio Josefo, cf. Feldman, 1999: 901-921; acerca do seu pensamento político e religioso, cf. Rajak, 2007: 585-596.
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reconhecimento (Vida, 3.16). A sua ligação a Roma inicia-se, com toda a probabilidade, a partir dessa altura, revelando-se ainda mais estreita no decurso da rebelião que se avizinhava6.
Chegou-se até mesmo a afirmar, se de facto não se iniciou aí, na viagem que fez a Roma, uma ligação política que influenciaria o comportamento de Josefo durante a rebelião: «a promise, explicit or implicit, to defuse the incipient revolution once he would return to Jerusalem»7. Existindo ou não, a partir desse momento, uma militância de Josefo em colaborar numa integração pacata da Judeia no mundo romano, a verdade é que a sua observação da realidade política e social de Roma tenha talvez favorecido a sua ligação, não apenas cultural, mas também política, com o Império; ou, pelo menos, a boa vontade que demonstrou em integrar-se no mundo romano e helenístico.
O colaboracionismo velado de Josefo e a sua duplicidade, antes e durante a guerra, é, de resto, assumido pelo próprio na sua autobiografia: ainda antes do eclodir do conflito, face à turbulência dos mais radicais, afirma que, reunido com a elite sacerdotal e os Fariseus, decidiu-se simular o apoio aos insurrectos, de forma a preservar no imediato as suas posições internas: «dado o claro e actual perigo para nós próprios, dissemos que concordávamos com as suas opiniões» (Vida, 5.22). Tratar-se-ia claramente de uma manobra em que as elites moderadas acediam à pressão dos insurrectos para os melhor poder controlar. Uma elite que, atemorizada com os levantamentos de forte base popular, procurava sustentar a sua própria posição, fazendo um jogo duplo enquanto esperava pela salvação vinda de Roma, possuidora da força militar necessária para estabilizar a situação: «Fizemos estas coisas antes de Cestius8 chegar com uma grande força para acabar com a rebelião» (Vida, 5.23).
Com efeito, Josefo acabou por ser designado para liderar a defesa da Galileia, assim que as coisas tomaram irremediavelmente o rumo da violência. O cerco movido pelos Romanos a Jotápata, lugar em que se entrincheirara com as tropas a si consignadas, teve o desfecho que se esperava no ano de 67: a cidade é tomada e os seus defensores renderam-se aos Romanos. O que surpreende neste episódio é a
6 Steve Mason refere a hipótese de uma relação clientelar contraída por Josefo com Popeia, simbolizada nos presentes que esta lhe oferecera, que se constituiriam assim como espórtulas, cf. Mason (ed.), 2001: 27 (n. 118).
7 Feldman, 1999: 902.
8 Cestius Gallus, governador da Síria.
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argumentação utilizada por Josefo, que lhe permitiu não apenas salvar a vida, mas também sair beneficiado da aventura. Perante Vespasiano, que assumia ainda a posição de general ao comando dos sitiantes, Josefo afirmou que Deus lhe teria confidenciado em sonhos que a Fortuna estava ao lado de Roma e que esta traria a vitória às legiões. Mas ainda vai mais longe: afirma mesmo que o conquistador de Jotápata se tornaria, um dia, imperador: «Pensas que Nero e aqueles que lhe sucederem, antes da tua acessão, irão continuar? Tu serás César, Vespasiano, tu e o teu filho aqui presente» (GJ, III, 401).
Josefo utiliza esta argumentação não apenas para ganhar o favor de Vespasiano, mas também para se justificar perante os próprios Judeus, artifício para salvar a sua própria vida e legitimar a sua posição que saíra fragilizada de Jotápata. Podemos mesmo vislumbrar, nestas declarações de Josefo, o intuito de salvaguardar o futuro de uma Judeia obediente após a “pacificação” romana, assim como o estatuto das suas elites, a que ele próprio, de resto, pertencia. Declarando que os Judeus já haviam sido suficientemente castigados, o autor utiliza assim um argumento tipicamente polibiano para sancionar a sua ligação a Roma, isto é, a noção de Fortuna, sinal do favor divino e destino manifesto que legitimaria a dominação romana a submissão dos Judeus. No entanto, este argumento era também facilmente entendido pelos seus próprios compatriotas Judeus, mesmo quando não fosse por eles aceite, na medida em que constituía um tema muito ligado ao livro de Daniel e à tradição nele contida acerca da sucessão de impérios universais (Mason, 1994: 161-191).
Vespasiano e os Flávios assumem assim, na obra de Josefo, uma legitimidade para governar, não apenas o mundo, mas também os Judeus (exactamente por esta ordem de importância, na perspectiva judaica), ocupando uma posição que talvez partilhasse alguns elementos com o tradicional messianismo judaico, ligado também à figura de Ciro e ao regresso do Exílio babilónico9. Esta talvez tenha sido a solução encontrada pelo autor para justificar comportamentos “pactistas” com a dominação romana, que pudessem favorecer a ordem e a estabilidade na Judeia e evitar o derramamento de mais sangue.
A extracção sacerdotal e aristocrática de Josefo pode ajudar a explicar este comportamento ordeiro, transposto para as elites tradicionais judaicas, sendo também
9 Importa referir, contudo, que a leitura do Livro de Daniel sugere que Roma iria também um dia desaparecer e que Israel voltaria a ter um papel preeminente entre as nações.
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um reflexo do seu desejo de integração num mundo mais vasto do que a Palestina. Certo é que ele, na sua interpretação das causas para a revolta, coloca grande parte da responsabilidade pelos tumultos em facções e grupos conhecidos pelo seu radicalismo10, como os Zelotas11, os Sicários e mesmo os Idumeus, procurando alijar a culpa pelo eclodir da revolta dos ombros do povo judeu, considerado no seu conjunto.
Certamente acusado de traidor por muitos dos seus compatriotas devido ao seu alinhamento com os goyim (os estrangeiros, os “gentios”), Josefo conseguiu, devido ao seu papel inicial de “profeta” da ascensão de Vespasiano a imperador12, receber, além de uma pensão, algumas propriedades perto de Jerusalém. Mais significativo do que isso, porém, é o facto de lhe ter sido atribuída a cidadania romana. Os seus tria nomina revelam a plenitude da sua ligação aos Flávios, não apenas a Vespasiano, mas também aos seus filhos Tito e Domiciano: Titus Flauius Iosephus.
Essa ligação ao poder romano reflecte-se nas suas obras, gerando uma duplicidade no seu discurso: profundamente ligado à cultura romana e helenística que conhece e cultiva, Josefo procura, não obstante, defender o judaísmo de que é originário das acusações que lhe são dirigidas. E isto não apenas numa tentativa de expurgar os “fantasmas” da guerra movida contra os romanos, mas também de apresentar os Judeus e a sua cultura através de uma luz mais positiva perante um mundo que a não compreende e que, em grande medida, a estranha.
3. A opinião anti-judaica.
A visão do mundo romano-helenístico sobre o Judaísmo é um aspecto não desprezível no estudo da obra de Josefo. Ele próprio, enquanto Judeu, deveria sofrer o escárnio que muitas pessoas alimentariam em relação às suas origens e à sua religião. Daí a necessidade que terá sentido de escrever Contra Apião, sua última obra conhecida, que responde aos ataques contra os Judeus desferidos por pessoas como Apião, Lisímaco ou Apolónio, que divulgavam os seus insultos a partir de Alexandria.
10 Acerca das tendências no interior dos rebeldes, cf. Jossa, 1994: 265-278.
11 Cf. a descrição de Josefo da violência e fanatismo dos zelotas em GJ IV, 560-563.
12 Cf. Hadas-Lebel, 1994: 99-106. A autora atribui um papel muito importante a Josefo na ascensão de Vespasiano. Um dos pontos que foca é a pressão dos seus próprios soldados: «the whole army knew that a Jewish captive by the name of Josephus (...) had predicted that his vanquisher would become emperor. Predictions sometimes come true because they tend to provoke the event that they foretell», 105-106.
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Jerry L. Daniel, num dos seus trabalhos (1979: 45-65)13, oferece-nos um quadro geral da opinião do mundo grego ou romano gerada pela convivência com o judaísmo, presente já em comunidades espalhadas por várias regiões. Colocando correctamente em perspectiva a sua utilização do termo “anti-semitismo”, o autor refere obras de autoridades como Tácito, ou de outras menos “sérias” como Juvenal ou Marcial, como expressões do que poderia ser o reflexo de uma opinião assaz generalizada acerca dos Judeus: geralmente negativa e trocista, mas não necessariamente militante ou agressiva14.
Tácito, por exemplo, refere uma teoria, bastante espalhada, de que os Judeus seriam leprosos expulsos do Egipto por Bócoris (Hist., V, 3). Afirma também que Moisés, liderando essa gente, abandonada pelos homens e deuses do Egipto, e sob o ferrete dessa maldição, «lhes deu novos ritos, opostos aos dos outros mortais» (Hist., V, 4)15. Tácito acusa-os de auto-segregação do resto dos Homens, a quem votariam «ódio e hostilidade» (Hist., V, 5), não comendo à mesa com gentios, proibindo o conúbio com mulheres estrangeiras e acusando-os de licenciosidade entre si. Enfim, ao contrário de outros povos, o culto judaico conteria práticas «bizarras e mesquinhas» (Hist., V, 5). O seu desejo de se demarcarem dos outros povos seria tal, continua Tácito, que praticavam a circuncisão para se reconhecerem entre si e se distinguirem de todos os outros povos: «Eles instituíram a circuncisão para se reconhecerem entre eles» (Hist., V, 5), inculcando «desprezo sobre os deuses estrangeiros» (Hist., V, 5). Mâneton, citado por Josefo em C. Ap., atribui igualmente origens maculadas aos Judeus, associando-os aos Hicsos e aos tempos “tenebrosos” que estes levaram ao Egipto (C. Ap., I, XIV, 73-90)16; ou por outro lado, caracterizando-os também como impuros e leprosos, reunidos por Amon-hotep para serem expulsos (C. Ap., I, XXVI, 232-235).
13 Sobre a figura de Moisés, cf. Hata, 1987: pp. 180-197.
14 O autor, de facto, preocupou-se em relativizar o conceito de anti-semitismo, tão actual e problemático, enquadrando-o criticamente no contexto que o seu artigo estuda. A opinião negativa face aos Judeus na época helenística e mesmo até aos primeiros séculos da era cristã, expressava-se sobretudo por: «a benign dislike rather than an active hatred of the sort that leads to persecution», Daniel, 1979: 47. Importa dizer também que faz uma incursão sobre algumas referências elogiosas e positivas sobre os Judeus.
15 «...nouos ritos contrariosque ceteris mortalibus indidit...».
16 Ainda citando Mâneton, podemos ver a informação de que os Hicsos, após a sua expulsão do Egipto, fundaram numa «região chamada hoje de Judeia, uma cidade (...) e lhe deram o nome de Jerusalém» (C. Ap. I, XIV, 90).
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De qualquer forma, o monoteísmo judaico e suas práticas religiosas, tais como a observância do Sábado, a abstenção da carne de porco, a interdição sobre a produção de imagens divinas e de qualquer ser vivente, ou mesmo a circuncisão, são tradições que pareceriam muito estranhas à generalidade dos povos com quem conviviam. A estranheza desses usos e crenças, assim como o exclusivismo atribuído aos Judeus, são factores que suscitariam algum desprezo ou desagrado. A sua fama de rebeldes, insubmissos e fanáticos, acentuada pela ressonância da sua revolta contra os romanos, fê-los ser alvo de acusações de sedição: Juvenal demonstra-nos essa visão dizendo que, «acostumados a desdenhar das leis de Roma, eles [os Judeus] não estudam, não respeitam, não temem nada a não ser o direito judaico transmitido por Moisés através de um livro misterioso» (Sat. XIV, 100-105).
Josefo responde a Apião, que acusa os Judeus de não erigirem estátuas aos imperadores nem de efectuar o culto a eles devido – tema sensível à soberania romana: declara que Moisés proibira a idolatria, não para que o seu povo se furtasse ao culto imperial de Roma, mas por que esta era «inútil a Deus e aos homens» (C. Ap., II, VI, 75); afirma também que aquele não proibira que se celebrasse e honrasse, «através de outras homenagens, em nome de Deus, os homens de bem». Do que procede que se concedia aos imperadores «essa honra suprema que recusamos a todos os outros homens» (C. Ap., II, VI, 75).
Assim, Josefo procura esclarecer os detractores do Judaísmo, dizendo que apesar de os Judeus não adorarem o imperador como coisa divina, o culto imperial era salvaguardado pela adoração a Deus, na conformidade das leis mosaicas, em favor do imperador e do seu poder. Nada mais compatível com a visão joséfica da História, moldada por Deus, que utilizaria os poderes terrenos para dar corpo aos seus desígnios.
Como nos diz B. Thérond, em relação à imagem de Vespasiano e dos seus sucessores ante Josefo, «les Flaviens sont la Figure du Salut, et cela en raison non de leur perfection morale et de leurs qualités psychologiques, mais du dessein de la Divinité»17. Tudo contribuía para que os Judeus fossem vistos como maus cidadãos, pouco dados à integração num mundo dinâmico do ponto de vista intelectual e filosófico, tolerante e multilateral do ponto de vista religioso. Desta forma podemos
17 Thérond, 1981: 241.
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entender a duplicidade de Josefo quando, demonstrando a sua cultura helenística e escrevendo em grego para gente de cultura grega e romana, incluindo Judeus, tentava rebater as acusações de que estes eram alvo. Podemos dizer que Josefo tenta estabelecer uma ponte entre esses dois mundos a que pertence, expressando as suas próprias convicções e experiência. Por isso, não é de admirar que o autor utilize muitas categorias e convencionalismos que o aproximam da literatura ou historiografia greco-latina. Um pequeno, mas perfeito exemplo disto mesmo, é a sua apresentação das três grandes seitas judaicas – os Fariseus, os Saduceus e os Essénios – como escolas filosóficas: philosophiai. Não obstante temermos estar a afastar-nos do propósito deste trabalho, passemos então a tentar perceber a visão de Josefo sobre os Essénios, grupo que, em muitos aspectos, representava uma parte do Judaísmo completamente oposto àquele de que o “profeta de Vespasiano” fazia parte.
4. Os Essénios segundo Josefo
A seita dos Essénios surge à luz da História no tempo do sumo-sacerdote hasmoneu Jónatas (c. 152-143 a.C.) e dela desaparece como consequência da revolta judaica, por volta do ano 68. Ao que parece, é a desaprovação daqueles que formariam a comunidade essénia sobre os actos de Jónatas, acusado de conspurcar o Templo e a Aliança com Deus, devido à sua tendência em misturar o poder secular e temporal, que despoletou essa espécie de “cisma” essénio e os levou a abandonar a sociedade convencional18. A sua localização geográfica tem no lugar de Qumran um núcleo muito importante, nas margens do Mar Morto, local onde foram encontradas as grutas contendo os famosos manuscritos, que muito nos dizem acerca das suas doutrinas. No entanto, encontravam-se espalhados em pequenos grupos por toda a Palestina: «Eles não ocupam apenas uma cidade, mas estabelecem-se em grande número em todas elas» (GJ, II, 124)19. As informações de Josefo são muito importantes porque, apesar de
18 Cf. Betz, 1999: 450: locupletando-se com bens confiscados no decurso da revolta dos Macabeus, Jónatas é acusado de «transgressing God’s commandments out of covetousness...», Josefo conta-nos que os Essénios enviavam oferendas ao Templo, e que faziam os seus sacrifícios de forma diferente, acentuando a importância da purificação (AJ, XVIII, 19). Pela sua “heterodoxia” aos olhos dos outros Judeus, estavam impedidos de fazer os sacrifícios no Templo que eles próprios consideravam, de resto, estar conspurcado pela corrupção da sociedade.
19 Apesar de os Essénios poderem estar presentes nas cidades, o seu modo de vida, moldado pelas suas crenças, enquadrava-se melhor num contexto rural, no arredor dos centros urbanos, ou em zonas isoladas intersticiais, como é o caso de Qumran. O seu desejo de se afastarem da sociedade a essas zonas os movia. Importa notar que Josefo nunca refere o lugar de Qumran ou o Mar Morto como habitat da seita.
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nos dizerem algo acerca das crenças essénias, fornecem-nos uma visão geral do seu modo de vida. Ao contrário das informações de Fílon de Alexandria sobre a seita, que coloca maior ênfase nos valores e conduta moral dos Essénios, assemelhando-os aos therapeutai. Não sendo o nosso objectivo principal estudar o Essenismo per se, foquemos a nossa atenção sobre as informações que Flávio Josefo partilhou connosco, pontuando-as com alguns dados mais concretos acerca dos Essénios20.
4.1. O modo de vida
Josefo conta-nos que os bens das pessoas que ingressavam na seita dos Essénios revertiam para o benefício do conjunto da comunidade (AJ, XVIII, 20; GJ, II, 122). Era o despojamento dos bens materiais que a isso os movia, e também ao uso das mesmas vestes e calçado, até que estivessem «despedaçadas e surradas» (GJ, II, 126-127). A sua disciplina, voltada para o desenvolvimento espiritual em detrimento do material, obrigava a uma rígida sobriedade dos costumes e a uma alimentação frugal, na estrita satisfação da necessidade de sobrevivência do corpo (GJ, II, 133). Obrigava também à recusa dos prazeres mundanos, que eram entendidos como vícios (GJ, II, 120), ao mesmo tempo que considerava como virtude o controlo das paixões e emoções, tidas como origem de conflitos e de injustiça. Os Essénios seriam, assim, «mestres dos seus temperamentos» (GJ, II, 135). Luxo e confortos com que pudessem aliviar o fardo da sua existência estavam também fora de questão: até mesmo o acto de ungir os corpos com óleos lhes estava interdita (GJ, II, 122-123).
Josefo apresenta-nos o essenismo como uma filosofia solidária, uma yahad, onde imperava a igualdade entre os Homens. Algumas das frases que utiliza remetem-nos para essa definição: «mantêm as suas posses em comum, e o homem rico não usifrui mais da sua propriedade do que o homem que nada possui» (AJ, XVIII, 20)21. Para além disto, o neófito jurava, no momento em que entrava plenamente no grupo, que caso viesse a ocupar algum cargo, nunca «fosse pelo vestir ou por outras marcas exteriores de superioridade, ofuscar os seus subordinados» (GJ, II, 140-141). Todos usavam, de facto, vestes brancas, iguais, que simbolizavam o seu sacerdócio dissidente e puro. Esse espírito expressava-se também na proibição de vender ou comprar
20 Para uma visão geral sobre o modus uiuendi, organização e teologia dos Essénios, cf. Betz, 1999: 444-470; cf. também Gruenwald, 1975: 5-6.
21 Cf. também GJ, II, 122.
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qualquer coisa entre eles: apenas era permitido trocar aquilo que necessitavam (GJ, II, 127). A recusa do casamento entre os Essénios, com excepção de alguns grupos (GJ, II, 160-161)22, estaria também ligada a esse desejo de igualitarismo. Josefo justifica assim o celibato essénio dizendo que o casamento «abre caminho a fontes de discórdia» (AJ, XVIII, 21). O celibato, segundo ele, era também, simplesmente, uma protecção contra a suposta infidelidade inata das mulheres (GJ, II, 121). Pensamos, contudo, que a recusa do casamento por parte da seita tinha como objectivo evitar a instituição de solidariedades parcelares que pudessem entrar em conflito com a solidariedade geral prescrita à comunidade23.
Apesar disto, podemos ver claramente que o igualitarismo essénio era bastante mitigado: talvez se possa afirmar que à igualdade antropológica dos Essénios se contrapunha uma visível hierarquia. Com efeito, alguns deles eram eleitos, por mão levantada, para exercer funções de administração dos bens da comunidade (AJ, XVIII, 22)24. Existiam supervisores que, pela sua antiguidade ou pelo maior conhecimento das Escrituras, tinham lugar preeminente: «Em todos os assuntos, eles nada fazem sem instruções dos seus superiores» (GJ, II, 134). Isto sem mencionarmos, como reflexo de hierarquias, os vários graus de iniciação que obrigavam os neófitos a provar, durante três anos, ser dignos de pertencer à comunidade: a distinção entre estes e os membros plenos era tal que, caso «um membro mais velho, mesmo que fosse apenas tocado por um “noviço”, deve tomar um banho, como depois de contactar com um estrangeiro» (GJ, II, 150).
Para além disso, lembremo-nos de que os Essénios consideravam a si próprios como o verdadeiro e puro “remanescente de Israel”, mantenedor da Aliança com Deus. A pureza e a virtude, assim cultivadas como sua obrigação moral, expressar-se-ia também, segundo Josefo, através da ajuda aos mais necessitados, «do ministério da assistência e da compaixão» (GJ, II, 134), para o exercício dos quais os membros da
22 Josefo fala de outra ordem de Essénios que aceitava o casamento apenas para fins de procriação, já que seria natural a renovação geracional da espécie humana. As mulheres que assim tomavam teriam também de passar por um período iniciático, para provarem ser dignas da pureza dos Essénios.
23 De facto, o matrimónio implica a “posse” de pessoas, mesmo que simbólica, o marido pela mulher ou vice-versa; implica solidariedade consanguínea e transmissão de património. Compreende-se a dificuldade demonstrada por um grupo que quer formar uma grande “família” espiritual, em aceitar instituições que pudessem com ela gerar conflito.
24 Cf. também GJ, II, 123.
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seita eram livres, desde que se abstivessem do nepotismo e de favorecer os seus próprios parentes (GJ, II, 134).
Essa elevada noção de justiça fá-los-ia ser extremamente imparciais e rigorosos. No único juramento que efectuariam em toda a sua vida na comunidade, que ocorria no momento da sua elevação a membros plenos da seita, comprometiam-se a «odiar sempre o injusto e a combater ao lado do justo» (GJ, II, 140). Quando convocavam um tribunal para julgar faltas de um dos seus membros, diz-nos Josefo que, «nunca emitindo sentenças num tribunal com menos de cem membros» (GJ, II, 145), as suas decisões seriam irrevogáveis: a blasfémia contra Deus ou contra o seu legislador, Moisés, era punida com a morte.
Severamente castigadas eram as faltas consideradas graves, através da expulsão da comunidade e a exposição dos ofensores, a quem seriam recusados alimentos e água (GJ, II, 144, 145).
Em linhas muito gerais, esta é a descrição da vida dos Essénios que Josefo nos legou, e que nos traz algumas pistas para a compreensão da complexa teologia da comunidade.
4.2. As crenças
O essenismo implicou uma ruptura com a sociedade judaica convencional e algumas inovações religiosas e teológicas. Mas, por outro lado, é notório um firme enraizamento na própria matriz cultural e religiosa do Judaísmo. É uma interpretação radical da religião judaica, embora o ambiente cultural e intelectual da época em que se desenvolveu permita falar de uma “nebulosa” de ideias novas, pairando sobre o Mundo Antigo, propiciadora dos sincretismos culturais e religiosos e a uma enorme criatividade intelectual.
A alteridade desse mundo começara a ser percepcionada de uma forma nunca antes vista a partir das conquistas de Alexandre, percepção essa cada vez mais diversificada e forte com a enorme expansão de Roma e da articulação do seu império com a oikoumenè. No entanto, o essenismo não é uma arbitrária mistura de doutrinas helenísticas e orientais, mas antes uma concepção radical do Judaísmo numa época em que o ambiente cultural e filosófico permitia novas formulações. A observação de uma realidade dinâmica à volta de Judá, e o seu confronto com a velha tradição bíblica
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– elemento central da matriz cultural dos Judeus e da sua religião, poderá talvez ter contribuído para o eclodir do essenismo.
Muita coisa, de facto, acontecera a Israel25. O Exílio terminara e o país continuava sem conseguir estabilidade política, persistindo no “erro” e na injustiça moral, “compactuando com os estrangeiros” e com o seu viver, à revelia da Aliança com Deus e das suas prescrições. Este é um tema recorrente, não podemos esquecer, da tradição dos livros proféticos.
Após o que parecia ser um regresso auspicioso a Jerusalém e a um Templo restaurado, continuaram as correrias guerreiras, até à chegada dos Romanos. Poderia, pois, a muita gente, escapar o sentido de toda a tradição histórica e teológica de Israel, dada a persistência das suas tribulações. Talvez isto possa ajudar a explicar, pecando nós talvez por incorrecção, novas interpretações acerca do papel de Israel na história e no mundo: a dos Essénios assumiu-se como radical e exclusivista, ascética até; a de Josefo assumiu-se conciliadora e aberta ao mundo que o rodeava, ainda que este defendesse com ardor as suas origens judaicas. É curiosa, portanto, esta dicotomia observada entre a postura de Josefo e a dos Essénios.
A religiosidade essénia radicava profundamente no Judaísmo e no estudo das Escrituras. Observa-se nela, inclusive, uma procura incessante pela revelação da verdade divina, saber de carácter esotérico, que pudesse transparecer do constante e disciplinado estudo efectuado pelos seus membros26. Diz-nos Josefo que os Essénios demonstravam «interesse extraordinário nos escritos dos Antigos»27, com intuitos terapêuticos e medicinais, mas também divinatórios e proféticos28. A sua observância do Sábado, referida por Josefo, parece ser mais estrita do que a dos outros Judeus, «abstendo-se de trabalhar no sétimo dia» (GJ, II, 147). Os textos que possuíam, comentavam ou escreviam, somente em hebraico ou aramaico, reforça essa sua ligação, embora sui generis, ao Judaísmo de onde provinham.
25 Tomamos aqui “Israel” no seu sentido cultural e ideológico. Há que distinguir, obviamente, os contextos históricos de Judá e Israel/Efraim.
26 Cf. Betz, 1999: «What was characteristic of the Essenes was the belief that at certain times the truth of the Torah was disclosed by special revelation; by this truth they meant the things that were pleasing to God, that were just and good in His eyes»: 455-456.
27 Naturalmente, as Escrituras judaicas.
28 Josefo afirma mesmo que «raramente, se alguma vez mesmo acontece, falham nas suas previsões», GJ, II, 159.
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Já referimos também a sua assunção do estatuto de “resto de Israel”, as suas lamentações sobre a mácula e impureza levada ao Templo, assim como o seu objectivo de manter a observância estrita da Aliança. No entanto, muito se disse acerca de hipotéticas influências de outras religiões e da filosofia grega sobre as suas doutrinas. As suas práticas astrológicas ligá-los-iam à Babilónia e o dualismo extremo (apropriadamente maniqueísta) que demonstravam na sua visão do mundo, reflectiria eventuais influências iranianas29. As suas concepções sobre a imortalidade da alma e sobre a retribuição; a sua recusa em efectuar juramentos, assim como a sua convicção acerca da predestinação e do determinismo divino, estabeleceriam uma forte ligação entre os Essénios e diversas escolas filosóficas gregas, como o pitagorismo, o platonismo ou o estoicismo. Ultrapassa um pouco o âmbito deste trabalho aferir da pertinência de tais influxos religiosos no essenismo. O que nos cumpre observar é a tendência de Josefo em suscitar a identificação dos Essénios com essas correntes de pensamento gregas. Caracterizemos então, em linhas gerais, a doutrina essénia, identificando as informações de Josefo.
A teologia essénia é profundamente determinista e dualista, apesar de, através de Josefo, esse facto pouco transparecer. Ao contrário dos Saduceus, que assumiam em pleno o arbítrio humano (AJ, XVIII, 16); ou dos Fariseus, que conciliavam o destino (heimarmenê) à liberdade da acção dos homens (AJ, XVIII, 171-172), os Essénios, como nos diz Josefo, «deixam tudo nas mãos de Deus» (AJ, XVIII, 18)30. O estudo do essenismo mostrou-nos que a seita acreditava que o plano que Deus gizara ab ouo previra a existência, em cada indivíduo, de um “espírito do erro” e de um “espírito da verdade”, sendo que um destes princípios determinaria o seu destino e carácter. Acreditavam também que Deus destruiria um dia o mal e a corrupção da Terra31, formando um novo mundo pleno de virtude e justiça, restaurando Israel: os Essénios viam-se como guardiães da Aliança, enquanto esperavam pela guerra contra os inimigos de Israel, que seriam derrotados.
29 Acerca da identificação de influências exteriores ao judaísmo na religiosidade e escatologia essénias, cf. Betz, 1999: 466-468.
30 Cf. também AJ, XVIII, 172-173. Apesar do dualismo essénio não ser referido pelo autor, estas passagens confirmam o seu conhecimento acerca da visão determinista da seita.
31 Aqui a doutrina essénia assemelha-se ao estoicismo na sua vertente determinista. No entanto, ao contrário dos estóicos, que formulavam o Mundo e a História como objecto de uma renovação cíclica, e portanto previsível, os Essénios pareciam alimentar uma crença linear acerca da História: a um mundo passado e presente, mau e corrupto, seguir-se-á um mundo justo e dominado por Deus, onde o Bem prevaleceria, que se iniciaria após a guerra contra os inimigos de Israel.
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O Arcanjo Miguel lideraria a essa luta do Bem contra o Mal e seria entronizado nos céus como Rei de Justiça (malki tsedek). Essa crença na predestinação dos homens, divididos entre os “Filhos da Luz” e os “Filhos das Trevas”, está associada a essa luta apocalíptica entre dois princípios opostos32 aguardada pelos Essénios, que deviam manter-se puros e disciplinados enquanto não se desencadeasse. É desta forma que podemos entender as informações de Josefo, quando caracteriza a obsessão essénia pela pureza. Como diz, «eles devem esforçar-se particularmente para se aproximarem da justiça» (AJ, XVIII, 18), encarando o óleo, substância supérflua associada ao luxo, como impuro, «mantendo a pele seca e vestindo-se sempre de branco» (GJ, II, 122-123). O banho era outro ritual de purificação exigido antes da entrada no refeitório: a refeição era um acto sagrado, entendido como um ritual que ajudaria a reforçar o espírito de união da comunidade. A preocupação dos Essénios com a pureza é tal que, segundo nos conta Josefo, chegavam a esconder-se, com um manto, dos raios do sol quando efectuavam as suas necessidades, para não ofender «os raios da divindade» (GJ, II, 148-149)33. Assemelha-se esta crença ao pitagorismo, na sua noção de pureza e recusa do juramento.
A imortalidade da alma é uma das questões que Josefo mais desenvolve acerca dos Essénios. O autor diz que, durante a revolta contra os romanos, que acabaria por destruir a seita, muitos sofreram torturas, sorrindo no meio do sofrimento. Nunca suplicando por clemência, «alegremente entregavam as suas almas, confiando que as receberiam de volta outra vez» (GJ, II, 153). É verdade que os Essénios acreditavam que a alma é imortal, encerrada no corpo físico como numa prisão. Acreditavam, segundo Josefo, «partilhando a crença dos filhos da Grécia», que às almas virtuosas estaria reservada, como recompensa, a estadia num bom lugar, após a morte, num
32 Como superariam eles a contradição entre a predestinação da natureza moral dos indivíduos e a sua insistência na busca pela pureza e virtude? Os Essénios afirmavam que nenhum homem poderia saber qual a sua natureza, se seria ou dos eleitos para se unir às hostes angelicais, até ao dia Julgamento Final. Por isso, «His allegiance needs to be constantly affirmed and confirmed through a life of divine service», Betz, 1999: 464. Como diz Hadas-Lebel, «Á la différence des Pharisiens, les Esséniens ne semblent pas avoir fait d’effort particulier pour conclilier la liberté de l’homme, sous-entendue par la rétribution, avec l’omniscience divine», Hadas-Lebel, 1989: 44.
33 A referência ao sol não nos deve levar a julgar os Essénios como adoradores de uma divindade solar. O astro do dia deverá ser talvez um símbolo que associaram ao Deus israelita; o sol é sinal de pureza, luz e, consequentemente, do Bem. Não esqueçamos também que o sol é símbolo da Justiça, que a tudo perscruta (vide o significado e funções do deus Šamaš). Josefo afirma mesmo que a preocupação dos Essénios como a pureza é tal que – espanto! – apesar de a defecação ser uma função orgânica natural, «tornaram a regra de se lavarem depois, como se estivessem contaminados» (GJ, II, 149-154).
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lugar sereno onde nem a neve nem o calor tórrido fustigam o espírito (GJ, II, 155). Josefo compara esse lugar com as Ilhas dos Bem-Aventurados, onde estavam os heróis e semi-deuses dos Helenos. Às almas injustas e corruptas, estaria reservada a permanência num lugar semelhante a uma masmorra, onde sofreriam toda a sorte de castigos, comparando Josefo tal sítio à crença dos Gregos no Hades (GJ, II, 156). A busca da virtude é, portanto, condição para a recompensa após a morte34, enquanto «as paixões dos malvados são refreadas pelo temor de, ainda que escapando à detecção enquanto fossem vivos, enfrentariam punições intermináveis depois de morrerem» (GJ, II, 157)35. É fácil associar esta crença na vida post mortem ao platonismo, expressa sobretudo no Fédon, ou n’A República.
5. A “utopia” essénia
O essenismo, enquanto doutrina e comunidade religiosa, existiu no tempo e no espaço. Deste modo, é possível estudar os textos que possuíam e os comentários que os Essénios neles deixaram, que nos revelam a forma como interpretavam a velha tradição bíblica. O essenismo não é, portanto, um fenómeno ficcionado, e as informações que dele nos chegaram não constituem apenas textos que reflectem um género literário particular. No caso concreto de Josefo e das elites políticas e religiosas presentes na Judeia, podemos perceber uma certa idealização da seita aliada a conhecimentos empíricos sobre ela. Como diz T. Rajak: «...the Jerusalem priestly establishment could hardly have afforded to be wholly ignorant of what radical Jewish sectaries a stone’s throw from Jerusalem were thinking and doing...»36
Mas se assumirmos que as utopias, na forma em que eram pensadas pelos Homens, também enquanto expressões de um género literário, podem nascer a partir das distopias e da insatisfação humana com uma realidade considerada injusta e má, o essenismo, tal como era visto por aqueles que o descreveram, talvez possa adequar-se de alguma forma a esse conceito: é uma doutrina nascida da insatisfação com o
34 Interessante a comparação com a noção pré-clássica da morte: “a casa dos mortos” é um lugar de indefinição, de igualitarismo total e absoluto; não há recompensa, apenas sombra, poeira e amorfismo, semelhante ao pré-mundo. O She’ol compartilha estas características. A retribuição esperada dos deuses, pelos actos humanos, é automática e terrena. A noção dicotómica da retribuição, no além-mundo é, desta forma, uma inovação no contexto do judaísmo.
35 A expressão-chave é «...ainda que escapando à detecção enquanto fossem vivos...». Aqui podemos vislumbrar a crença essénia na revelação da natureza predestinada de cada indivíduo.
36 Rajak, 1994: 144.
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mundo, considerado corrupto, a partir do tempo de Jónatas Hasmoneu e daquilo que consideravam ser a conspurcação do Templo de Jerusalém. É a partir daí que se os Essénios se retiram do século, formando na região inóspita de Qumran um dos seus núcleos mais importantes do conjunto da sua comunidade. Será que os próprios Essénios julgavam ter criado uma sociedade perfeita, ideal e utópica? Ou será que apenas julgaram estar a construir as bases para que essa sociedade pudesse um dia ser concretizada? Jacob Neusner postulou que tanto os Essénios como os Fariseus julgaram estar a viver duas formas distintas de utopia na terra (Neusner, 1959: 284-290), colocando talvez a questão numa perspectiva um pouco simplista, à distância que olhamos para o seu artigo. Afirma que a comunidade de Qumran «chose a revolutionary path to Utopia» (Neusner, 1959: 290), enquanto que os Fariseus, continuando a viver no século, encarnariam uma espécie de “utopia social”.
Quanto a nós, ultrapassando um pouco a barreira entre a realidade e o discurso acerca dela, julgamos importante fazer uma breve reflexão, ainda que puramente teórica, acerca de eventuais relações entre o essenismo e a utopia, destacando algumas características comuns que esta geralmente apresenta.
Do ponto de vista geográfico, os Essénios viveriam num não-lugar ou num bom lugar? Qumran, assim como todos os outros lugares onde viviam eram, naturalmente, lugares reais; não eram ilhas paradisíacas, embora o isolamento fosse por eles procurado e pudessem estar presentes em centros urbanos na Palestina, ou pelo menos nos respectivos termos. Do ponto de vista essénio, também não eram bons lugares, já que eles próprios se assumiam como exilados, que foram para longe de Israel e Jerusalém, para a “terra dos cananeus”, devido à corrupção do mundo. Se a história é conflito, então os essénios viviam plenamente uma certa concepção de História, já que o dualismo entre o bem e o mal, entre “os espíritos do erro” e os “espíritos da verdade” era origem de constante luta interior. O tempo existe de forma linear, e não letárgica, a-temporal ou cíclica, à maneira estóica: a um tempo mau, presente, seguir-se á necessariamente um tempo bom, futuro, no qual Deus destruiria o mal do Mundo, restaurando Israel e a dinastia davídica. Da mesma forma, os Essénios não sobrevalorizavam a noção de uma Idade do Ouro no passado: pelo contrário, é uma Idade do Ouro no futuro que assume importância capital para eles. A utopia essénia, se eles realmente julgavam vivê-la, ainda não se tinha realizado, sendo que para isso deveriam manter-se puros e aguardar pela sua chegada. O passado
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dourado acabara com a queda dos Anjos e não com o pecado de Eva; o futuro escatológico, contudo, seria na Terra, em Israel. A perfeição do mundo e implantação da Justiça era esperada sobretudo nesse tempo. Do que procede que a punição ou a recompensa de cada indivíduo após a morte seria apenas o prelúdio daquilo que consideravam ser o Dia do Julgamento.
Por outro lado, os Essénios tinham uma vivência fortemente comunitária e fraternal, estabelecendo, todavia, uma rígida hierarquia entre leigos e sacerdotes, noviços e membros plenos; entre os encarregados da administração mundana e os outros que obedeciam a esses supervisores; entre os mais versados nos segredos das Escrituras e os que o eram menos; entre os Judeus – eles próprios, enquanto verdadeiro “resto de Israel” – e todos os outros povos gentios. A exclusividade masculina da seita é outro elemento que matiza o “igualitarismo” essénio. As mulheres, naquele ramo da seita que Josefo diz praticarem o casamento para fins de procriação, parecem ter um estatuto diferente na comunidade. Por último, a dicotomia que atribuíam ao potencial moral humano contribui também para pôr em causa a essa visão essencialmente igualitária transmitida por Josefo: a Humanidade está dividida entre os “espíritos do erro” e os “espíritos da verdade”; entre “Filhos da Luz” e “Filhos das Trevas”, que travarão um combate no fim do tempo.
6. Os Essénios segundo Josefo: apologia ou utopia?
O Essenismo não é uma invenção ou uma efabulação de Flávio Josefo. Não acreditamos que seja igualmente apenas uma metáfora utópica com vista a descrever, ou sequer a propor uma sociedade perfeita. A sua descrição baseia-se em conhecimentos que o próprio autor detinha, por via da sua experiência pessoal37, e em informações que obtivera por terceiros. Contudo, as suas descrições são adaptadas à audiência a que se dirige e direccionadas para veicular uma imagem positiva dos Judeus, desde logo pela já referida identificação das suas seitas com escolas filosóficas, factor que procurava, julgamos nós, gerar uma certa empatia entre ele e o seu leitor, certamente imbuído da cultura greco-romana. O discurso de Josefo sobre os Essénios,
37 Lembremo-nos que Josefo declarara na sua autobiografia que, na juventude, procurara conhecer as “escolas filosóficas” judaicas para tomar uma decisão sobre se se juntaria a uma delas (Vida, 1.10). T. Rajak aceita que esta informação é mais do que um convencionalismo literário, mas que pode corresponder à realidade: «... an author who both had seen for himself and had the capacity to decipher», Rajak, 1994: 144.
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não sendo “incorrecto” ou efabulado, até porque se foram obtendo diversas confirmações por via do estudo dos textos de Qumran e da arqueologia, obedece todavia a determinados propósitos. Podendo ser a nossa interpretação errada ou parcial, arriscamos, não obstante, dizer que o autor quer mostrar a gregos ou romanos que a sociedade judaica foi capaz de gerar um grupo numeroso de homens virtuosos, possuidores de uma grande piedade e disciplina, que lhes permitia controlar as piores fraquezas e defeitos do género humano. É essa a ponte que ele quis construir, ligando as suas origens ao mundo que o acolheu e ao qual de bom grado se juntou, cultivando os sincretismos tão típicos do helenismo.
É notória a imagem assaz positiva que Josefo veicula acerca da seita, já que, segundo ele, «qualidades como as suas, nunca foram antes encontradas em qualquer Grego ou Bárbaro» (AJ, XVIII, 20). Os Essénios, para além disso, possuem «o mais elevado carácter, devotando-se unicamente ao trabalho agrícola» (AJ, XVIII, 19), virtude certamente apreciada pelos gregos ou romanos mais conservadores. Viviam em comunhão e irmandade, prestando entre si mútua ajuda. Na administração da comunidade, «elegem, de mão levantada, homens honrados para receber os seus rendimentos» (AJ, XVIII, 22)38, alusão que Josefo poderá ter aproveitado para suscitar uma identificação remota com as virtudes da polis.
A imparcialidade e rigor que lhes atribui nos assuntos judiciais, tal como a sua dimensão moral da justiça (GJ, II, 141), contribui também para essa imagem positiva dos Essénios, da mesma maneira que as suas afirmações acerca do dever da seita em ajudar os mais necessitados, refutando assim as acusações de auto-segregação que impendiam sobre os Judeus. Apesar desta dimensão positiva e idealizada da comunidade essénia, persistimos na dificuldade em atribuir ao discurso de Josefo sobre os Essénios uma natureza utópica, já que os textos desta natureza possuem geralmente os seus próprios convencionalismos e topoi, e muitas vezes se assumem claramente como textos de ficção39.
Num trabalho sobre este tema, Doron Mendels (1979: 207-222) afirma que as utopias helenísticas formaram «a primary framework, or model, used by the first Essenes when they desired to create a perfect society» (Mendels, 1979: 209). Este
38 Cf. também GJ, II, 123.
39 Talvez os melhores exemplos sejam as aventuras de Iâmbulo na Etiópia e na “Ilha do Sol”, segundo Diodoro Sículo, ou Uma História Verídica, de Luciano.
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autor estabelece uma extensa comparação entre a descrição ficcional do modo de vida do povo da “Ilha do Sol” da história de Iâmbulo e o dos Essénios, ainda que Mendels não aprofunde questões doutrinais. A problemática que aborda está intimamente ligada com a questão das influências do mundo helenístico sobre a Palestina e o judaísmo. Embora a questão seja fundamental e pertinente, é notória a dificuldade em associar dados característicos das correntes de pensamento do mundo pós-alexandrino e romano às inovações observáveis na religião dos Judeus. De resto, é sobretudo difícil – apesar de importante – provar uma ligação imediata do pensamento utópico no período helenístico e as suas expressões literárias, com a formação de uma comunidade religiosa ascética que existiu em concreto na Palestina.
Flávio Josefo efectuou uma selecção criteriosa da informação que pretendia transmitir, realçando certos aspectos da vida da seita e escolhendo omitir outros. Por exemplo, omite a prática da circuncisão, a interdição de imagens divinas e a interdição sobre a carne de porco. Não releva o monoteísmo que os Essénios partilhavam com os demais Judeus, mas detém-se nas suas crenças sobre a imortalidade da alma e da retribuição após a morte, assim como a função solar do seu culto, que lhes atribui. Estes aspectos que abordámos anteriormente são, de facto, vulneráveis à troça e desaprovação em relação aos Judeus. É compreensível que Josefo não os refira, apesar de um leitor, na sua época, facilmente poder associar aos Essénios essas práticas, já que o autor os refere explicitamente como sendo Ioudaioi (GJ, II, 119). Escolhendo realçar a questão da imortalidade da alma, estabelece o paralelo com as crenças dos Gregos, que se vão popularizando, talvez prevendo que a recepção dessa informação, já por si importante, gerasse familiaridade.
Tendo conhecimento do denodo com que Josefo se batia – tal como Fílon de Alexandria, no Egipto – na defesa dos seus compatriotas Judeus e das suas crenças contra as acusações de que são alvo, o que é visível nas suas Antiguidades Judaicas e em Contra Apião, observamos assim a tentativa de apresentar os Essénios como exemplo de um grupo, pleno de virtudes, no interior do Judaísmo. Talvez ele tivesse querido mostrar que foi possível, entre um povo frequentemente humilhado e olhado com desdém, criar uma sociedade justa e quase perfeita. Se existe um laivo de utopia no discurso de Josefo, talvez seja neste ponto que o encontramos, muito embora não acreditemos que a sua intenção fosse escrever um texto do género.
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Abreviaturas
AJ – Antiguidades Judaicas
GJ – Guerra Judaica
C.Ap. – Contra Apião
Vida – Vida de Josefo
Sat. – Sátiras
Hist. – Histórias
As passagens citadas dos textos antigos foram traduzidas por nós para português, a partir das seguintes edições:
Josephus, with an English translation by H. ST. J. Thackeray, Ralph Marcus, Louis H. Feldman. Londres: William Heinemann; Cambridge: Harvard University Press, 1950-1969. 9 vols.
Flavius Josèphe. Contre Apion. Ed. e notas T. Reinach; trad. L. Blum. Paris: Les Belles Lettres, 1930.
Flavius Josephus. Translation and commentary. Ed. Steve Mason, vol. 9, Life of Josephus, trad. Steve Mason. Leiden/Boston/Colónia : Brill, 2001.
Juvenal – Satires. Trad. P. de Labriolle e F. Villeneuve. Paris: Les Belles Lettres, 1957.
Tácito – Histoires. Trad. H. Bornecque. Paris: Éd. Garnier Frères, s.d.
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